The Informant (O Delator)

Mark Whitacre é um empregado de uma grande empresa agro-alimentar, que resolve denunciar ao FBI os acordos ilegais de preços que a empresa onde trabalha faz, mas antes do FBI poder avançar com um caso contra a empresa, precisa de provas. Whitcare concorda em levar um gravador escondido para as reuniões mais importantes, mas o comportamento estranho de Mark leva o FBI a desconfiar que tudo não passa de uma invenção.

Crítica: Soderbergh é, talvez, de todos os realizadores, ditos, mainstream um dos mais experimentalistas. Tanto assim é que se analisarmos o seu percurso cinematográfico desde meados dos anos 80 até à actualidade encontramos os mais diversos tipos de filmes, géneros, histórias e protagonistas. Como exemplo, e meramente a esse título, destacamos a loucura de Sexo, Mentiras e Vídeo, o Oscarizado filme biográfico de Erin Brockovich, a rede humana de Traffic, a ficcção científica de Solaris, os filmes-pipoca de Ocean, e o épico (falhado) de Che.

De facto, contrariamente a outros realizadores, dificilmente encontramos na obra de Soderbergh elementos únicos que o distingam ou caracterizem, fazendo com que cada um dos seus projectos seja único, valendo por si mesmo, sem qualquer ligação estética ou estilística a um outro filme anterior. Se essa é ou não uma mais valia do realizador, caberá a cada um dos espectadores da sua obra decidir.

Ora, o Delator é um exemplo dessa mesma filosofia. Com efeito, o filme surge como algo inesperado no percurso de Soderbergh. Comecemos pelo género em que o mesmo se deve categorizar. Antes de mais trata-se de um filme biográfico, na medida em que retrata, parte, da vida de uma personalidade real. Mas é certamente muito mais do que isso, uma vez que o registo adoptado é de (alta) comédia, onde o sorriso tende a permanecer nos lábios do espectador ao longo do filme. Por outro lado, a estrutura narrativa, assente na divulgação a conta gotas da informação que a personagem detém, prende a atenção do espectador fazendo com que demos por nós sem conseguir esperar qual será o próximo passo da personagem e qual o segredo (ou não) que esta esconde.

De facto, o argumento, sem querer revelar quase nada, é um dos pilares essenciais deste filme, uma vez que nos recônditos das afirmações que o protagonista faz durante a acção, quer em off ou em discurso directo, esconde-se a verdade sobre a sua personalidade, entre segredos e mentiras doseadas ao longo da narrativa.

Com efeito, Mark Whitcrane interpretado brilhantemente por Matt Damon nada mais é que um fura-vidas, que vai conseguindo através de um jogo de espelhos, driblando tudo e todos até um determinado momento em que a Verdade, de que ele foge e se esconde, o consegue alcançar e desconstruir, sendo certo que a conclusão final a tirar é de que nada na vida, muito menos a personalidade humana, é linear.

No que concerne ao casting, destacamos a escolha acertada do protagonista visto que Matt Damon encarnou (ganhando peso, bigode e até ficando careca) na perfeição a seriedade desta personagem, que nunca se defrauda, gerindo os seus silêncios, gestos e efeitos cómicos de uma maneira muito própria, principalmente, muito real. A difícil arte da comédia encontrou em Matt Damon um bom embaixador, especialmente num registo difícil que não apela à gargalhada, mas sim a um sorriso tão irónico e cínico como o da própria personagem.

Por outro lado, no que respeita ainda ao casting, cumpre salientar a escolha de Scott Bakula, como agente do FBI, que para a minha geração será sempre recordado como o brilhante actor-protagonista da série de ficção científica Quantum Leap, que era transmitida ao início das tardes da RTP1, nos anos 90.

Bakula há muito afastado dos grandes papéis no cinema – recordo a sua participação efémera em American Beauty de Sam Mendes – regressa em grande num papel à sua medida, que o mesmo confere autenticidade formando uma dupla bem conseguida com Joel McHale.

De resto, o elenco secundário do filme, apesar de quase desconhecido, serve bem os seus personagens, em particular, Melanie Lynskey, no papel de Ginger, mulher do protagonista.

Esteticamente ressalto a fotografia do filme, que de imediato nos transporta para os anos 90, sendo que o guarda-roupa e os cenários são irrepreensíveis, denotando um especial cuidado. Esta crítica não ficaria completa sem o destaque, mais que merecido, da banda sonora do filme, que pontua todos os momentos cómicos e de tensão, revelando-se uma aposta bem conseguida.

Em jeito de conclusão, devo afirmar que não sou um grande admirador de Soderbergh, destacando da sua obra dois filmes que apreciei em particular. O Delator será o terceiro. Apesar de não ser brilhante no todo, nem tampouco um dos melhores do ano, vale pela recriação da realidade, com a pitada certa de humor, e com um protagonista à altura. Não é imprescindível ver, mas de certo, juntamente com Erin Brockovich e Traffic é um dos melhores filmes de Soderbergh.

Título Original: “The Informant” (2009)
Realização: Steven Soderbergh
Argumento: Scott Z. Burns e Kurt Eichenwald
Actores: Matt Damon, Scott Bakula, Melanie Lynskey
Género: Comédia, Biografia
Avaliação: 7 out of 10 stars (7 / 10)

André Ramalho

Sou um apaixonado por filmes e cinema, e por isso resolvi criar este blog, com o intuito de partilhar as minhas opiniões e críticas sobre filmes.

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